Nossa vida pode
ser relatada através dos carros que passaram por cada um. Eu não
sou diferente. Usei muito os carros da minha mãe. Quando eu tinha 5
anos, meu pai usava uma Pickup Fargo azul escura, lá pelo final dos
anos 50. Acho que era ‘58. Tinha câmbio na coluna da direção, 3
marchas, tração traseira. Era usada para trabalhar, a serviço da
secretaria do obras do RS. Não existia motorista específico, cabia
ao usuário dirigi-la e fazer toda a manutenção.
Lembro que uma certa
vez, à tardinha, indo por uma estrada interiorana, entre Pinheiro
Machado e Piratini, ficamos num atoleiro, eu e meu pai, era inverno
frio como habitual em Pinheiro Machado. Passamos a noite inteira
atolados, sem luz, só uma lanterna com três pilhas amarelonas,
gastas e deixamos minha mãe precupadíssima. De manhã cedo, eis que
surgem os faróis de uma patrola da Prefeitura, que ficam nos cantos
da capota, brilhando. Motivo de alegria no interior da Fargo. Foi,
meio que tardiamente nossa salvação, que tardou mas não falhou.
Minha mãe começou aprender a dirigir nesta Fargo, e dirige até
hoje, aos 85 anos.
Depois foi uma
pickup rural amarela. Foi o 2o carro da prefeitura de Pinheiro
Machado, cidade onde nasci e meu pai virou prefeito pelo antigo PTB
do Brizola. Não tenho muitas lembranças deste carro, mas tenho de
um Mercedes caminhão tombadeira azul, este o 1o veículo pertencente
à prefeitura, comprado de 2a mão. Aí conhei o Maneco, mecânico da
Prefeitura, meu idolo. Eu queria nesta época ser mecânico, não sei
se era pela perspectiva de usar macacão ou viver sujo de graxa.
Depois nos mudamos
para Porto Alegre, pai, mãe e minha irmã Paula, já falecida. Aí
meu pai, então engenheiro da Petrobras, entrou num grupo de
consórcio, criado pelo pessoal da Petrobras e comprou uma DKW Vemaguet ano 63, a porta abria para a frente, beje, capota branca,
tração dianteira, 4 marchas à frente. Sistema elétrico de 6
volts. Tinha um rádio valvulado com reator para poder alimentar com
corrente alternada as válvulas. Quando ligava gerava um ruído
característico.
Com essa DKW fomos
ao Rio de Janeiro e passamos 3 meses lá, na casa de meu tio, no Rio
Comprido, meus pais, minhas duas irmãs Paula e Bárbara. Nunca
esqueço que num trecho da viagem, entre Curitiba e São Paulo,
provavelmente na serra do Café, minha mãe comentou que aquela
região era um “deserto”, quando minha irmã Bárbara, de pronto
retrucou: - Eu não vi nenhum camelo aqui… Ficamos com a DKW 10
anos, e meu pai insistia em ficar mais tempo com ela. Dizia que ela
tinha chassis de aço, não era monobloco, por isso mais durável,
base mais rígida. Afinal, foi um dos últimos carros com chassis de
aço fabricados no Brasil. Bem, minha mãe aprendeu a dirigir
definitivamente com essa DKW, e lembro que a 2a marcha dificilmente
engatava sem arranhar a caixa. Foi vendida para um cara de Rio
Grande.
Em ‘69, compramos
uma saboneteira azul escuro (VW 1600 4 portas sedan) para minha mãe.
Foi comprada na Unidos da Lima e Silva, onde hoje é um Zaffari. Foi
um avanço, pois tinha brucutu para limpar o pára-brisa e rádio
transistorizado. E o pisca-pisca voltava automaticamente. No centro
da direção tinha um brasão, onde estava escrito “Paulistarum
terra mater”. Não tenho muitas lembranças deste carro, só que
logo depois, creio que ante os elogios ao carro, que inegavelmente
era superior à DKW, um tio, irmão do meu pai, também comprou uma
saboneteira.
Em 73 trocamos a
soboneteira por uma Variant azul calcinha que logo apresentou
problemas de caixa e tocamos por uma nova Variant amarelo ovo,
comprada em São Jerônimo, onde meu pai trabalhava, na implantação
da antiga Aços Finos Piratini, hoje privatizada, com o nome Gerdau.
Com esta Variant participei de minha primeira batida. O cara bêbado,
cheirava a vinho, não respeitou a preferencial, que era minha e
batemos, mas se eu tivesse mais experiência e malícia, poderia ter
evitado.
Resgatei numa
madrugada de 3a feira um amigo detido pela Polícia Federal depois da
aula de Geometria Analítica da faculdade de engenharia. Normalmente
nas saídas das aulas de 3as e 5as à noite, na volta para casa da
UFRGS até a Auxiliadora onde morava, passava no parque Moinhos de
Vento (Parcão) onde se juntava o que hoje chamam de “galera” pra
bater um papo. Onde hoje tem um edifício havia um terreno aberto
onde estavam instalados trailers, incluindo o Torta de Panela, que
parece, na época, estaria traficando. Bem passando de Variant
amarelo ovo na frente do bochincho, achei estranho que estivesse
cheio de carros e pouquísimas pessoas. E como não encontrei a
“galera”, me fui para baixo da cobertas, pois era inverno.
Estou dormindo e
toca o telefone. Era a mãe de um colega de faculdade me indagando se
eu sabia do fulano. Achei estranho, me vesti de novo e na Variant
amarela fui até a casa do meu amigo, que ficava a um quarteirão de
minha casa e peguei a mãe preocupada.
Depois de idas e
vindas e informações colhidas no Torta de Panela, concluimos que
ele, nascido em Curitiba, e mais um bando haviam sido conduzidos
coercitivamente para a Polícia Federal, que ficava na Avenida
Paraná. Chegando à Polícia Federal, pela Av. Cairú, parecia uma
saída de baile, gente em grupos caminhando pelo meio da rua e
calçadas. Uma legítima saída de festa, afinal todos tinham sido
liberados. Em meio à turba, encontramos meu amigo e levamos mais uns
5 dentro da Variant, inclusive na cachorreira, até o Parcão para
buscarem seus carros. Com essa Variant fui a Santa Cruz do Sul para o
estágio do CPOR.
Fuca da Marília.
Ela tinha um “fusca” verde chamado de treme-treme. Fomos com ele
a um churraso grego num sítio pela região de Arroio dos Ratos e
prestamos socorro a um amigo com uma possante Caravan, que tinha um
mau contato no negativo do borne da bateria e parava repentinmente
por falta de faísca. Apesar de tremer muito, nunca nos deixou na
mão.
Com este fuca
participei do meu segundo acidente, na Av Maracanã no Rio de
Janeiro, novamente poderia ter sido evitado, se eu reduzisse a marcha
antes de acreditar em sinal verde. Fomos parar eu e Marília no
Hospital Miguel Couto. Felizmente sem sequelas, apenas um mês depois
meu primo médico extraiu um pedaço de vidro da cicatriz em meu
queixo.
Variant II foi o
próximo passo. Eu chamava de Bosta II. Ainda mais depois que um cara
de Kombi bateu atrás da Bárbara, ela parada com a sinaleira
fechada, na esquina da Plínio com a Carlos Gomes. Com essa Variant
II fiz várias viagens, acampei em Bombinhas e praia da Pinheira,
ambas em SC. Ficamos, eu e a Marília, que veio a ser minha atual
esposa, de dar carona para umas amigas, que prepararam guloseimas
farináceas, que acomodei no porta malas dianteiro. O tanque de
gasolina era na frente e vazou com tanque cheio, contaminando toda a
comida, que teve que ser jogada fora. Uma pena!
Antes da crise do
petróleo foi a vez do Opala 4100, cor tijolo, Standard, 4 marchas,
câmbio no túnel, 2 portas, pneus sem câmara tipo linguiça. O
carro não tinha nada que chamasse a atenção, mas motor 4100. Nesta
fase eu era meio que metido a “boy”. Na saída de uma festa do
Lindóia, estava na carona com um amigo meu que estava namorando uma
guria. Um pretendente da guria, com um Opala todo “embandeirado”
(rodas especiais, e uns floreios lá) decidiu fazer um charme e colou
em nosso lado na Assis Brasil e começou a acelerar em aberto, meio
que propondo um “pega”. Como eu estava bem calçado topei,
cometendo uma irresponsabilidade. Nem preciso dizer o que aconteceu.
Um Opala 4100 contra um 2500! Mas esse era o carro do meu pai.
O último carro que
compartilhei com minha mãe foi a Nissan Livina dela. Tínhamos que
ir ao Uruguay, na fronteira, comprar mirapex ER, eu e um amigo
parkinsoniano como eu, e as respectivas esposas, ficamos no hotel de
trânsito de militares em Jaguarão – RS, e o grande porta-malas
fez a diferença diante das compras nos frees shops uruguayos.
Bem esses foram os
carros da minha mãe que compartilhei. Obrigado minha mãe, por
compartilhar comigo teus carros. E FELIZ DIA DAS MÃES!
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